sábado, 23 de abril de 2011

Meninas Boazinhas vão para o céu, as Más vão à luta.

Não é minha esta frase, na verdade é o título de um livro escrito por uma alemã, Ute Ehrhardt, publicado em meados dos anos 90.
Eu era secretária do Conselho da Mulher quando ouvi falar deste livro.
Confesso que fiquei curiosa, mas nunca o li, ouvi as pessoas que leram dizer que se identificaram com várias questões levantadas pela autora, sua busca por responder quais são as nossas motivações e nossos medos, o que nos leva a determinados comportamentos.
Por que assumimos como nossa, a responsabilidade da educação dos filhos? Por que temos medo das críticas? Por que é tão importante o que pensam a nosso respeito?
Não sei bem se nós teremos respostas objetivas e quantitativas, para explicar o motivo pelo qual, fazemos e aceitamos certas coisas.
Olhando pra minha experiência e para as mulheres que conheci, fica difícil fazer um corte cirúrgico entre o mundo subjetivo, que na mulher é rico e tem um grau de importância ímpar,e o objetivo, este particularmente mais encontrado no homem ou no mundo masculino.
 As mulheres não abrem mão das nuances, da sensibilidade e assumem para si os cuidados com a saúde, educação e principalmente com as memórias afetivas da família: aquela sensação gostosa da casa limpa, do café com leite de manhã, da roupa passada, do chá para melhorar de um resfriado...até daquela frase: leve uma blusa, que pode esfriar. Levar filho na escola, conhecer a professora, participar das reuniões, das festas, preparar o lanche, ajudar na lição de casa, nos trabalhos...
É a mulher que mais lida com o filho desde os primeiros dias, que amamenta ( coisa que sabemos, só faz bem), que troca fraldas, que acalenta...O marido ou companheiro assiste e pode até, sentir o quanto a mulher é poderosa na sua capacidade de gerar a vida e depois, somente com seu leite, manter a criança viva.
A mulher conhece melhor os hábitos de cada um, suas qualidades e defeitos...quem gosta de comer  com molho ou sem, quente ou frio...
Fomos criadas e educadas para exercer o papel conciliador, protetor, de parceira, para perceber a satisfação ou o desconforto das pessoas; para receber bem as visitas, os amigos e os amigos dos filhos.
 Aceitamos uma diferença no tratamento entre os  universos: privado X público. Chegamos mesmo ( sociedade) admitir educação diferenciada para meninos e meninas, proporcionando aos filhos, marido, companheiros que, sejam criados e educados por nós   tendo a oportunidade de ir à luta mais objetiva, num comportamento mais agressivo, uma postura menos contemplativa.
Não sou capaz de afirmar que temos uma divisão rígida do mundo feminino e masculino tampouco do público e privado, sequer afirmo que os homens não tem sensibilidade e que a mulher não é objetiva; não é assim que entendo as relações mas é assim que elas são tratadas por muitos autores, por muitas ideologias e por seguimentos da sociedade.
Somos plurais, temos uma capacidade enorme de aprendizagem e nunca devemos esquecer que as necessidades fazem com que cada um supere as expectativas.
Durante o tempo que participei mais ativamente no Conselho da Mulher, ouvi muitas Palestras, reuniões que acabavam com um delicioso chá, beijos e "até a próxima querida..." e, voltávamos a nossa rotina.
 Falavamos das questões de gênero, do papel da mulher, da violência contra a mulher, de política, das leis; da alta nos produtos da cesta básica, da gravidez na adolescência,  menopausa, estupro,  Assédio sexual, vaga nas creches, falta de médicos nos postos, dificuldades de exames de mamografia...tudo, todos os temas.
Estava mais que comprovada, a nossa visão objetiva de tudo que  precisamos,  acabada a reunião e já na despedida diziamos  ou podíamos ouvir o que cada uma, tinha como preocupação em suas cabeças..." tenho que correr pegar meu filho na escola...tenho que preparar o almoço...nossa esqueci de recolher a roupa e vai chover...preciso avisar minha filha pra tirar a comida do congelador..."
 Muitas das mulheres que participaram das reuniões, acordavam mais cedo pra deixar " tudo no jeito" e pedia pra um dos  membros da família traze la e depois vir busca la.
Nas reuniões políticas o mesmo acontecia, eu mesma fui várias vezes participar de manifestações, de reuniões, nas rádios, levando o Guto e a Mariana no colo, desde pequenos meus filhos me acompanham nas idas e vindas à prefeitura, Câmara, hoje levo comigo o meu neto...
 Nestas  reuniões ou melhor,  naquelas sobre política, foi mencionado a falta da maior participação das mulheres nos partidos, além do preconceito e da desigualdade de tratamento para candidatos e candidatas seria interessante notar  que em nada estes espaços são acessíveis, pois se recusam a enxergar as dificuldades que enfrentamos  em nossa dupla jornada.
Foi feita uma lista de pequenas ações com a proposta de tornar estes espaços mais condizentes com a realidade das mulheres, por exemplo: oferecer um café reforçado para aquelas que viriam do trabalho; espaço e pessoas que ficassem com as crianças para as que não tenham com quer deixar os filhos; horários e dias que não prejudicassem a rotina das mulheres nem a das crianças devido à escola...Foi numa destas reuniões  em São Paulo, quando eu estava trabalhando de assessora, que surgiu a idéia de uma " cartilha" para mulheres candidatas. Foi mais ou menos assim: tínhamos agora a lei de cotas, eu mesma já tinha sido candidata; só que as mulheres sentiam se despreparadas para o pleito. Desconheciam o trabalho de uma vereadora, não podiam contar com a mesma estrutura e apoio que os candidatos, tinham suas responsabilidades com a casa, dos filhos  e teriam que enfrentar o preconceito da sociedade e da família. Afinal, como é uma campanha? A proposta seria fazer um material que ajudasse a mulher, que fosse feito para dar " dicas" de como conduzir uma campanha, como conseguir expor suas propostas, qual é a função de uma vereadora. As mulheres já tinham duas cartilhas  produzidas pelos Conselhos dos Direitos da Mulher Nacional e  Estadual. Trouxe para Sorocaba os problemas levantados nesta reunião e ninguém deu atenção, fiquei decepcionada; mas era comum eu ouvir a seguinte frase: falar de mulher é bobagem, mulher não vota em mulher, é perder tempo...Apresentei a proposta escrita em uma reunião de assessoria e algum tempo depois a idéia veio pronta numa pasta que não mais tinha o meu nome  ou de onde ela surgiu...  Falamos ainda se as reuniões partidárias deveriam ser realizadas em separado, somente para o público feminino ou se teria a participação dos homens...Neste ponto tenho cá minha opinião,
não sei se eles tem real interesse em ouvir aquilo que  fazem questão de ignorar em suas casas. Como se dá ouvir as mesmas coisas que suas esposas, companheiras, irmãs, colegas, dizem o tempo todo...e propositalmente é ignorado, como se fosse uma ladainha qualquer...Quiçá os homens entendessem a importância desta participação, cuidando de atender suas necessidades e ouvindo sua versão dos fatos e do mundo.
O que me causa indignação é o fato de alguns políticos fazerem um discurso recheado de promessas: com e para as mulheres, justamente eles que não respeitam nossa rotina. Facil notar, por exemplo quando agendam as tais  Audiências Públicas , geralmente a mulher é quem mais comparece nesses casos pois os maridos estão trabalhando,e lá vão as mulheres se interar do que está acontecendo na política, mais atuantes e de quebra mais conscientes dos problemas do bairro, da escola, da saúde, do transporte, da educação, que muitos leitores de jornal. Trazendo nos braços os filhos, os netos que nesse dia faltaram da escola, pois não tinha com quem ficar. E para a tal da reunião, elas acordaram mais cedo pra fazer suas tarefas, sendo que algumas elas irão terminar quando chegarem  " mais tarde." Criada a expectativa de uma resposta objetiva as suas necessidades, o que  acontece é um longo debate e um único compromisso: levar ao conhecimento do Executivo...e esperar...
Fica a pergunta: fomos usadas para fortalecer este legislador e seu partido, sim ou não? Fomos manipuladas? Eles realmente estão comprometidos com nossas bandeiras? Conhecem e respeitam nossas necessidades? Continuamos sendo relegadas a invisibilidade e nossa contribuição desvalorizada?
Passaremos da invizibilidade  para o papel de protagonistas das nossas lutas, seremos: meninas más?
Vamos deixar de fazer aquilo que nos ensinaram fazer desde sempre, e vamos delegar estas tarefas a sociedade e ao Estado.
Amamentar? Tem a mamadeira,  temos outras coisas pra fazer e afinal para amamentar é preciso paciência, a criança mama  a cada duas horas, o peito fica dolorido, temos que amamentar à noite...Esqueçam.
Vamos por na creche, afinal trabalhamos, produzimos. Cuidar de criança suga nossas energias. Onde encontrar tempo pra ginástica? Curtir a casa? Depois...Nos finais de semana a criança fica com a avó, com a tia...Hora de descansar, namorar e cuidar da casa. Em que hora  tomar um chopinho com as amigas?
 Comida? Vamos comer pizza, lanches, vamos comer enlatados, embutidos...comida por quilo...nem pensar em ir pra cozinha  o tempo urge...tempos modernos..às 7 hs na creche às 17 hs a tia da Van pega a criança deixa na casa da amiga e lá pelas 19hs a mãe chega...Tudo contado no relógio, no ritmo...Ufa! Eu quero colo, será que a criança também quer? Será que a mulher ainda vai por roupa de molho, fazer algo pro jantar, ir pra escola( faculdade), fazer a unha, dar uma geral na casa...já arrumou a cama? passou roupa? Descongelou a geladeira? Fez a lista de compras? Espere ainda tem que: amar, ouvir, brincar com o filho ou filhos e conversar com o marido ou companheiro...e estar bonita, sorrindo a perfumada.
 Somos capazes de tudo isso? Somos felizes assim sobrecarregadas ou repartidas em nossa vontade de fazer aquilo que esperam de nós e nossa necessidade de sobreviver? Muitas mulheres sustentam sua família e o mundo cobra nossa participação, nossa contribuição nas decisões cruciais que serão as prioridades destes tempos; não vamos fugir de mais esta responsabilidade. Não deixaremos somente pra os homens o ônus da administração do mundo. Vamos nós, mulheres, dar um basta à corrupção; às desigualdades e  preconceitos; à fome; às drogas; à violência; às guerras; à impunidade...   Quanta responsabilidade temos sobre nossos ombros...como somos fortes. E nossos filhos, estaremos sacrificando alguma coisa em nosso relacionamento com eles? Estamos enfraquecendo nossos laços?  Sempre podemos traze los, nossos filhos, conosco pra aprender como se luta, para fortalecer nossos argumentos, para demonstrar à qualquer autoridade política ou não, o quanto nossas necessidades são urgentes e quão digna a nossa luta.
Sempre fazemos opções, mas algumas vezes é gritante a necessidade de sobrevivência, eis que acabam as alternativas e sobre pressão, abrimos mão de uma maior convivência dentro do lar, para que não falte comida na mesa, um teto...
 Cada vez mais mulheres partem para a vida pública, com o foco nas políticas públicas que tem relação direta com: a educação, saúde, moradia...tudo que afeta a vida das famílias,tudo com  tratamento de parceria e responsabilidade social. Deixar de pegar os filhos na escola, de verificar suas tarefas na casa, de pensar na rotina da casa? Jamais!
Minhas queridas e maravilhosas MULHERES de todos os cantos, de todas as raças, de todas as classes, nem Boazinha ou Más.
Penso na riqueza de todos os Debates que participei, nas Palestras que ouvi, nas Reuniões interessantíssimas que estive...mas não me esqueço da aflição de todas em voltar pra casa e cuidar da sua família. VIVA AS MULHERES.!

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